terça-feira, 4 de novembro de 2014

A importância do limite

Saber dizer “não” é, segundo os especialistas, um dos aspectos mais saudáveis da educação.
Uma das maiores dificuldades na educação de uma criança consiste na tarefa de saber dosar amor e permissividade com limite e autoridade. Todos têm consciência da importância de impor limites, mas o fato de saber disso não é suficiente para fazer desta uma tarefa fácil. Os pais freqüentemente se deparam com muitas dúvidas: Estou agindo certo? Onde eu errei?
A criança, até o fim do primeiro ano de vida, obedece ao princípio do prazer. Por isso procura apenas fazer o que lhe causa satisfação e tenta fugir do que é vivido como algo desprazeroso. Nesse estágio, ela age por impulso instintivo. Esse é o primeiro sistema de funcionamento mental e é denominado pela psicologia de id.
Ao mesmo tempo, essa impulsividade é uma das necessidades mais prementes em seu desenvolvimento, que, quando reprimida, gera crianças apáticas, desinteressadas e rigidamente bem comportadas. A necessidade de tocar, mexer, destruir e tentar reconstruir objetos são atividades importantes e fazem parte de sua forma de entrar em contato com o mundo externo.
A partir dos 18 meses, a criança começa a se opor para afirmar-se e existir por si mesma. É o início da fase do não, tão temida pelos pais, e que termina, na melhor das hipóteses, por volta dos três ou quatro anos. Nessa fase, trata-se de uma oposição sistemática. Para uma criança, dizer "não" significa apenas: "Eu acho que não! E você?" Ela quer uma resposta dos pais que, favorável ou não, terá, o mérito de indicar os limites. A partir dos três ou quatro anos, a criança passa do "não" sistemático para o "não" refletido, que afirma seus gostos e escolhas.
Culpa e castigo
Desde cedo, a criança percebe que seu comportamento impulsivo, em vez de satisfação, acarreta uma censura por parte do mundo externo. Como, acima de tudo, a criança deseja o apoio e a aprovação dos adultos e necessita muito deles, especialmente dos pais, começa a compreender que precisa controlar melhor seus desejos e impulsos. Ao conformar-se gradualmente com as imposições do meio ambiente (educação), controlando os desejos que não podem ou não devem ser satisfeitos, vai se estruturando o sistema moderador ou filtrador, o ego.
A parte moral da personalidade se manifesta quando julgamos nossos atos como bom ou mau. Isso depende de um sistema de autocensura, denominado superego. O superego desenvolve-se a partir do ego, mediante a internalização dos modelos externos, das advertências e censuras.
O superego passa a atuar sobre a criança da mesma maneira que os pais: punindo-a quando se comporta mal e dando-lhe a sensação de bem-estar quando age corretamente. A punição assume um aspecto de sentimento de culpa ou de inferioridade,ou de angústia. A recompensa proporciona, orgulho, realização ou sensação de cumprimento do dever, ou seja, uma virtude.
Até dois ou três anos, a noção do proibido não lhe faz ainda muito sentido. Será preciso repetir-lhe muitas vezes o que ela pode ou não pode fazer, explicando-lhe em poucas palavras a razão dessa proibição. Somente após essa idade, a criança passa a compreender, cada vez melhor, as ordens dadas, começando a entender as noções de bem e de mal.
As crianças, ao contrário do que se pensa, são muito preocupadas com regras. Agir dentro de limites, oferece-lhes uma estrutura segura para lidar com uma situação nova e desconhecida.
É fundamental que os adultos tenham clareza de suas convicções e sejam fiéis a elas, pois, para os pequenos, eles são modelos vivos a serem seguidos. É por meio do convívio com essas fontes de referências que eles vão estruturando a sua própria personalidade.
A criança que não aprende a ter limite cresce com uma deformação na percepção do outro. As conseqüências são muitas e, freqüentemente, bem graves como, por exemplo, desinteresse pelos estudos, falta de concentração, dificuldade de suportar frustrações, falta de persistência, desrespeito pelo outro – por colegas, irmãos, familiares e pelas autoridades. Com freqüência, essas crianças são confundidas com as que têm a síndrome da hiperatividade verdadeira, porque, de fato, iniciam um processo que pode assemelhar-se a esse distúrbio neurológico. Na verdade, muito provavelmente trata-se da hiperatividade situacional, pois, de tanto poder fazer tudo, de tanto ampliar seu espaço sem aprender a reconhecer o outro como ser humano, essa criança tende a desenvolver características de irritabilidade, instabilidade emocional, redução da capacidade de concentração e atenção, derivadas, como vimos, da falta de limite e da incapacidade crescente de tolerar frustrações e contrariedades.
O pediatra e psicanalista britânico Donald Winnicott dizia: “É saudável que um bebê conheça toda a extensão da sua raiva. Na vida, existe o princípio do desejo e o princípio da realidade. Uma criança a quem se cede em tudo imediatamente, ‘a quem nunca se recusou nada’, como dizem os pais, suporta mal a frustração. Muitos desses pais que cedem sempre vêem o filho no presente, ao passo que aqueles que sabem dar sem mimar vêem o filho no tempo e no futuro”.     
 

Por: Maria Guimarães d. Grupi.

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