Algumas vezes me pego imaginando a irreal possibilidade de “encontrar” com o autismo. Se o autismo fosse
uma pessoa, e nós nos encontrássemos, o que eu diria para ele?
Pensando nisso, deixei minha imaginação criar asas e me levar para um
encontro inusitado e impossível com o Sr. Autismo.
E foi assim que tudo aconteceu em minha imaginação:
“A porta se abriu e ele entrou. À princípio, cabisbaixo. Na verdade, a postura aparentemente silenciosa e tímida era apenas um disfarce que ele usava com frequência para se aproximar de suas “vítimas”. Sorrateiro, fazia com que sua presença, no início, fosse tênue e pouco perceptível. Deixava para se tornar intenso e marcante quando já estava completamente instalado, à vontade, no papel de vilão – papel esse que sabia desempenhar com maestria, como ninguém.
Furtivo, tal qual um ladrão, “roubava” o olhar daqueles que decidia “atacar”. Escolhia suas vítimas fortuitamente. Suas escolhas não obedeciam critérios e eram extremamente difíceis de ser compreendidas. Por mais que estudassem seus métodos, não havia um consenso sobre como ele definia seus alvos.
Sem dúvida, essa era a estratégia que usava para dificultar qualquer tentativa que pudesse impedir ou atenuar suas ações. Embora eu já o conhecesse há 8 anos, seu rosto ainda era desconhecido para mim. Quando nos olhamos, e pude ver sua face, meu primeiro impulso foi buscar seus olhos. Ele, um contumaz ladrão de olhares, possuía um olhar igualmente vazio.
Ao me deparar, frente a frente, com aquele que havia roubado meu filho e parte de meus sonhos, senti um misto de raiva e tristeza. Não pude conter as lágrimas, olhando para o responsável pelo medo incessante que tenho do futuro, por saber que, um dia, partirei e deixarei meu filho.
Gritei …
Contudo, não foram gritos. Foram urros; de dor, de angústia, de tristeza … A mágoa, por tantos anos guardada em meu peito, jorrou ininterruptamente, sem que eu tivesse nenhum controle sobre isso. Não sei ao certo por quanto tempo chorei … Sei que foi tempo suficiente para aliviar meu coração e me acalmar, recobrando o fôlego para lhe dizer tudo aquilo que eu sempre sonhei.
As perguntas saíram em disparada:
Quem era ele, de verdade?
Por que fazia isso com milhares e milhares de crianças?
Por que destroçava a vida das famílias por onde passava, deixando um rastro de dor e sofrimento?
Por que fazia questão de ser um “enigma” para a medicina, dificultando pesquisas e impossibilitando a descoberta da cura?
Não se envergonhava de calar suas vítimas, presas inocentes e frágeis, enclausurando-as, dentro de si mesmo, dificultando seu contato com aqueles que tanto lhes amam? Questionamentos e acusações se alternaram, durante um bom tempo, em busca de respostas que não vieram.
Para minha frustração, durante todo nosso encontro, ele permaneceu calado, não tendo proferido uma única palavra. Não consegui detectar em seu rosto nenhuma sombra de remorso ou arrependimento. Seu rosto, impassível tal qual uma esfinge, me desafiava a decifrá-lo.
Assim que terminei, ele virou as costas e abriu a porta, preparando-se para sair. Embora não tenha recebido as respostas que buscava, sentia-me um pouco mais leve. Percebi que não me importavam as respostas, as justificativas, ou até mesmo a ausência delas. Compreendi, com clareza, que ele NÃO era o vencedor daquele embate!
E então, antes que ele saísse, reuni forças e gritei a plenos pulmões:
Autismo, eu te odeio!!!
É verdade que você tirou de nós muitas coisas! Mas o mais importante, ninguém, muito menos você, foi e jamais será capaz de tirar: o imenso AMOR que me une ao meu filho!!! Não preciso ouvir absolutamente nada que venha de você! Você é quem precisa saber que EU AMO MEU FILHO! E este amor que sinto por ele é infinitamente maior do que meu ódio por você!
Abruptamente, ele se virou.
E, pela primeira vez, pude ver em seu semblante alguma reação. Incrédulo, parecia não acreditar no que acabara de ouvir. Mas compreendeu, então, que havia perdido; pois nada no mundo pode ser mais forte do que o AMOR de uma Mãe.”
Por Denise Aragão.
“A porta se abriu e ele entrou. À princípio, cabisbaixo. Na verdade, a postura aparentemente silenciosa e tímida era apenas um disfarce que ele usava com frequência para se aproximar de suas “vítimas”. Sorrateiro, fazia com que sua presença, no início, fosse tênue e pouco perceptível. Deixava para se tornar intenso e marcante quando já estava completamente instalado, à vontade, no papel de vilão – papel esse que sabia desempenhar com maestria, como ninguém.
Furtivo, tal qual um ladrão, “roubava” o olhar daqueles que decidia “atacar”. Escolhia suas vítimas fortuitamente. Suas escolhas não obedeciam critérios e eram extremamente difíceis de ser compreendidas. Por mais que estudassem seus métodos, não havia um consenso sobre como ele definia seus alvos.
Sem dúvida, essa era a estratégia que usava para dificultar qualquer tentativa que pudesse impedir ou atenuar suas ações. Embora eu já o conhecesse há 8 anos, seu rosto ainda era desconhecido para mim. Quando nos olhamos, e pude ver sua face, meu primeiro impulso foi buscar seus olhos. Ele, um contumaz ladrão de olhares, possuía um olhar igualmente vazio.
Ao me deparar, frente a frente, com aquele que havia roubado meu filho e parte de meus sonhos, senti um misto de raiva e tristeza. Não pude conter as lágrimas, olhando para o responsável pelo medo incessante que tenho do futuro, por saber que, um dia, partirei e deixarei meu filho.
Gritei …
Contudo, não foram gritos. Foram urros; de dor, de angústia, de tristeza … A mágoa, por tantos anos guardada em meu peito, jorrou ininterruptamente, sem que eu tivesse nenhum controle sobre isso. Não sei ao certo por quanto tempo chorei … Sei que foi tempo suficiente para aliviar meu coração e me acalmar, recobrando o fôlego para lhe dizer tudo aquilo que eu sempre sonhei.
As perguntas saíram em disparada:
Quem era ele, de verdade?
Por que fazia isso com milhares e milhares de crianças?
Por que destroçava a vida das famílias por onde passava, deixando um rastro de dor e sofrimento?
Por que fazia questão de ser um “enigma” para a medicina, dificultando pesquisas e impossibilitando a descoberta da cura?
Não se envergonhava de calar suas vítimas, presas inocentes e frágeis, enclausurando-as, dentro de si mesmo, dificultando seu contato com aqueles que tanto lhes amam? Questionamentos e acusações se alternaram, durante um bom tempo, em busca de respostas que não vieram.
Para minha frustração, durante todo nosso encontro, ele permaneceu calado, não tendo proferido uma única palavra. Não consegui detectar em seu rosto nenhuma sombra de remorso ou arrependimento. Seu rosto, impassível tal qual uma esfinge, me desafiava a decifrá-lo.
Assim que terminei, ele virou as costas e abriu a porta, preparando-se para sair. Embora não tenha recebido as respostas que buscava, sentia-me um pouco mais leve. Percebi que não me importavam as respostas, as justificativas, ou até mesmo a ausência delas. Compreendi, com clareza, que ele NÃO era o vencedor daquele embate!
E então, antes que ele saísse, reuni forças e gritei a plenos pulmões:
Autismo, eu te odeio!!!
É verdade que você tirou de nós muitas coisas! Mas o mais importante, ninguém, muito menos você, foi e jamais será capaz de tirar: o imenso AMOR que me une ao meu filho!!! Não preciso ouvir absolutamente nada que venha de você! Você é quem precisa saber que EU AMO MEU FILHO! E este amor que sinto por ele é infinitamente maior do que meu ódio por você!
Abruptamente, ele se virou.
E, pela primeira vez, pude ver em seu semblante alguma reação. Incrédulo, parecia não acreditar no que acabara de ouvir. Mas compreendeu, então, que havia perdido; pois nada no mundo pode ser mais forte do que o AMOR de uma Mãe.”
Por Denise Aragão.
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