Surtados, sem dormir, sem tempo para nada, mas vivos.
Tá certo que eu sou mais uma dentre uma espécie chamada
“professor”, que semi morre todo final de ano. Mas do sofrimento dos
professores ninguém duvida. Estamos até um pouco na moda, vira e mexe
aparecem posts fofos a nosso respeito, com ursinhos, imagens de pôr do
sol e tudo mais.
Mas, sejamos justos, do drama dos universitários ninguém fala.
Tento ser durona com meus alunos, mando parar com o mimimi do fim do
semestre, mas acabo sempre admitindo, ainda que não conte para eles, que
os coitadinhos estão mesmo lascados.
Eu me lembro bem: segundo ano da faculdade, prova oral de processo
civil e previdenciário no mesmo dia. Fatídico dia em que o termo
“gastrite” saiu das bulas de remédios e foi parar na minha barriga pela
primeira vez.
Gastrite, torcicolo, enxaqueca, dor nas costas, aftas, espinhas
monstruosas. Universitário em época de prova é o sonho de toda farmácia e
o pesadelo de todo plano de saúde.
Homens não fazem a barba, mulheres não depilam a perna. Suspeito, às
vezes, que até do banho eles acabem esquecendo. Mas em nome do
conhecimento, tá tudo liberado.
Universitários no fim do ano ficam completamente xaropes. Erram o dia
da prova, estudam a matéria errada, vão fazer exame de matéria na qual
passaram direito, esquecem caneta, esquecem a mochila, esquecem o nome
do professor, quando não esquecem o próprio nome.
Por alguns dias, essas criaturas chegam ao ponto de passar mais tempo
atualizando o portal para tentar verificar as notas (taca-lhe pau no
F5) do que no facebook, no whatsapp e no instagram. Juntos.
E entre novembro e dezembro, quando chego para dar aula antes das 8
da manhã ou ainda estou na faculdade depois das 22 (pois é…), tenho a
sensação de estar em um episódio de The Walking Dead. Alunos com aspecto
moribundo perambulam pelos corredores como se não houvesse esperança,
pensando seriamente em devorar cérebros de professores para ver se
facilita na hora da prova.
E se o aluno estiver precisando de meio pontinho e encontrar o
professor na cantina, pode aparecer o Caio Castro, a Ísis Valverde, o
Ashton Kutcher ou a Megan Fox, que eles NÃO saem de lá. Oferecem um
café, compram sonho de valsa, elogiam a roupa, tudo na maior
sinceridade. Como diria Tim Maia, vale tudo.
E não podemos esquecer da interminável angústia das faltas.
“Professor, o sistema está marcando 26 faltas, mas eu juuuuuro que só
faltei 3 vezes. Não sei o que houve.”. Clássico. Esses sistemas são
mesmo uns canalhas.
Mas dentre os surtados, o Prêmio Nobel do Surto Acadêmico vai para os
que vão defender o TCC. Esses já nem se recordam que existe um negócio
chamado “vida”. Passam na frente da banca de jornal e já têm dor de
barriga só de pensar na palavra “banca”. O vocabulário se resume a: capa
dura, capítulo, rodapé, orientador, espiral e pânico. Não tem água com
açúcar, suco de maracujá ou calmante que resolva. O único remédio para
essa dor é um composto de 8 letras: a + p + r + o + v + a + d + o.
Mas, falando sério, não é fácil mesmo. Tem que ter muita força de
vontade e compromisso. Provas, trabalhos, fichamentos, estágio, emprego,
trânsito, ônibus, metrô, chuvaradas no fim da tarde, correria para
evitar atrasos, chororô para justificar atrasos.
Tem um ou outro fanfarrão, mas a maioria dá duro mesmo. Tem conta pra
pagar; casa para arrumar; relatório para entregar; filho para cuidar.
Desses alunos que têm filho, por sinal, sou fã incondicional.
Não vou dizer para vocês que quando se formarem melhora. Seria
mentira. As responsabilidades crescem em uma proporção bem incompatível
com a progressão do salário; as horas de sono não aumentam e ainda tem
uma pós, um mestrado e um futuro te esperando.
Mas posso dizer: vale a pena. Segurem a onda, força na peruca,
inspira, respira, não pira. Já já o Natal tá aí. E uma hora o diploma
também chega. Talvez vocês já não tenham cabelos, as unhas estejam
completamente roídas, as olheiras tenham cor de berinjela e a miopia
alcance 8 graus em cada olho, mas acreditem gatinhos, vocês chegam lá.
Palavra de quem chegou (com algum cabelo, alguns dentes e alguma
sanidade, até que se prove o contrário).
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